segunda-feira, 28 de abril de 2014

TORCEDOR QUE ATIROU BANANA É BANIDO DO ESTÁDIO

O Estado de S. Paulo, 28 de abril de 2014 | 15h 03


Villarreal pune para o resto da vida torcedor que atirou banana em campo. Equipe espanhola publica nota garantido que responsável por jogar fruta em Daniel Alves será banido do estádio El Madrigal


SÃO PAULO - O Villarreal, equipe que disputou a 35ª rodada do Campeonato Espanhol com o Barcelona, no último domingo, divulgou nota garantido que já identificou o torcedor que atirou uma banana no lateral-direito da equipe adversária, o brasileiro Daniel Alves, e mais, afirmou que o responsável já teve o seu carnê de sócio retirado, e que nunca mais poderá acessar o estádio El Madrigal.


Reprodução


"Graças às forças de seguranças e à inestimável colaboração da exemplar torcida amarela, o clube já idenfiticou o autor (do ato racista) e decidiu retirar seu carnê de sócio, além de proibir seu acesso ao estádio El Madrigal pelo resto da vida", publicou o Villarreal por meio de seu site oficial.

Na nota, o clube ainda fez questão de repudiar qualquer manifestação e atos preconceituosos, além de lamentar o ocorrido ressaltou que não serão toleradas atitudes que incentivem a discriminação.

"O Villarreal volta a manifestar sua vocação pelo respeito, pela igualdade, pela desportividade e pelo jogo limpo, tanto dentro como fora do campo, e rechaça qualquer ato que vá contra esses princípios, como violência, discriminação, racismo e xenofobia", ressaltou o comunicado.

O CASO

O lateral-direto do Barcelona e da seleção brasileira, Daniel Alves, se preparava para cobrar escanteio quando uma banana foi atirada por um torcedor do Villarreal, mandante da partida. O jogador pegou a fruta do chão e comeu, ironizando o ato racista.



Torcida joga banana para Daniel Alves, que come e cruza para gol do Barcelona. Brasileiro foi mais uma vez insultado por torcedores na Espanha, mas dá de ombros e dá exemplo

27 de abril de 2014 | 18h 04

O Estado de S. Paulo



VILLARREAL - O brasileiro Daniel Alves voltou a ser vítima de racismo na Europa. Na partida entre Villarreal e Barcelona, neste domingo, pelo Campeonato Espanhol, a torcida do time da casa jogou uma banana em direção ao lateral-direito da seleção brasileira quando ele se preparava para cobrar um escanteio. A cena não é inédita no futebol. Provocações desse tipo têm se alastrado no esporte.


Mas desta vez, a intenção do torcedor espanhol racista não deu certo. Irreverente, Daniel Alves não se intimidou com a agressão, pegou a fruta no chão dois passos à sua frente e decidiu comê-la, tirando de letra a ofensa e dando exemplo. Na sequência da jogada, o brasileiro bateu dois escanteios seguidos como se nada tivesse acontecido. No segundo deles, já com a banana digerida, saiu o segundo gol do Barcelona.

Um dos atletas que mais sofrem com racismo no futebol europeu, Daniel Alves deu mostra de que é superior a esse tipo de discriminação racial e ajudou sua equipe a vencer o Villarreal por 3 a 2, com duas assistências para gols. O resultado deixa o Barcelona ainda na disputa pelo título Espanhol, agora com 84 pontos, na segunda colocação. O líder Atlético de Madrid está com 88.

Após o jogo, Daniel Alves continuou mostrando-se acima de qualquer provocação racista. "Estou na Espanha há 11 anos e há 11 anos é dessa maneira. Temos de rir dessa gente atrasada", disparou o brasileiro, prestes a ter seu nome confirmado para disputar a Copa do Mundo com a seleção brasileira.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

PAIXÃO E VIOLÊNCIA NO FUTEBOL

pré-Univesp
pré-Univesp – No. 1 2010 – Copa do Mundo – Jun 2010


Artigos


Torcer sim, mas perder a linha que separa o “eu” e o clube e cometer atos insanos jamais, diz professora da Unicamp

Por Heloisa Helena Baldy dos Reis





Os brasileiros ao nascerem recebem duas denominações que os acompanharão por toda a vida: um nome e um time para torcer. A predileção por um time de futebol é quase que herdada. Aqueles filhos que renegam essa herança são vistos como traidores e causam grandes decepções e frustrações aos seus progenitores. Mas não irei falar das exceções e sim da regra.

A paixão clubística pelo futebol é herdada e passa a ser vivida já a partir dos primeiros anos de vida. Ela é verificada pelo uso de uniformes dos times, principalmente as camisas. A criança, com sua natural ingenuidade, aprende dentre as primeiras palavras o nome do seu time. E por que será que na sociedade moderna, urbanizada, o futebol torna-se uma grande paixão? Há muitas explicações e eu abordarei algumas delas.

O principal motivo para um indivíduo sentir-se atraído pelo futebol é, segundo estudiosos do esporte, o grande prazer que essa atividade proporciona ao seu público. As dimensões do campo, o número de jogadores, o tamanho do gol e o equilíbrio na disputa entre as equipes provocam nos espectadores uma tremenda excitação, porque há um longo período de expectativa entre a saída da bola e a chegada da mesma nas zonas de maior probabilidade de gol. Os passes e os dribles provocam no público certa tensão, que será elevada dependendo do equilíbrio estabelecido entre as equipes rivais, pois jogos muito fáceis não são tão excitantes.

E por que o ser humano dos séculos XX e XXI precisa buscar o prazer nos jogos de futebol, seja dos times profissionais ou mesmo em “peladas” de final de semana? As respostas são dadas pela observação de um processo civilizador vivido pela humanidade, no qual os indivíduos foram criando uma espécie de autocontrole da expressão de seus sentimentos em público. Isso tem diferentes níveis se compararmos sociedades distintas, mas algo parece semelhante em quase todas elas: a seriedade verificada no mundo do trabalho. O trabalho exigiu das pessoas seriedade, autocontrole e disciplina. Todas essas exigências são relaxadas nas atividades de lazer, como é o caso do espetáculo futebolístico.

O futebol é uma possibilidade de vivência controlada de descontroles, ou seja, de expressão de emoções em público, e a castração das emoções no ambiente do trabalho fez com que os indivíduos passassem a ter necessidade de busca por atividades miméticas, como é o caso do espetáculo esportivo.

Mas o que são essas atividades miméticas? São todas as atividades que permitem aos indivíduos a vivência de fortes emoções, sendo que estas não trarão, a princípio, riscos para os mesmos. A derrota do time em um jogo, por exemplo, poderá ser vivida com fortes emoções de frustração, tristeza e desespero, a ponto de levar os torcedores do time que perdeu ao choro, ao grito de ódio pela perda. No caso de uma vitória, os torcedores chegam a sentir tanta alegria a ponto de soltar gritos de emoção. Sentimentos de poder, de grandeza e de força são vivenciados e muitos chegam a chorar de felicidade quando a conquista é muito desejada e a vitória se concretiza.

A paixão pelo futebol começa a tomar uma dimensão preocupante e a se tornar um problema quando a percepção da identidade individual do torcedor fica frágil e comprometida, a ponto do indivíduo não perceber quem é ele e quem são seus ídolos. O torcedor e a paixão clubística misturam-se e começam a acontecer atos transgressores, agressões fortuitas, e até delitos e atos vandálicos.

A violência nos dias de jogos de futebol transformou-se em uma questão de segurança pública em diversos países e, no Brasil, já fez 64 vítimas fatais, apenas nãos jogos da elite do futebol brasileiro. Nos anos de 1980, a violência no futebol parecia um problema localizado apenas na Inglaterra, onde recebeu o nome de hooliganismo. Hoje, no entanto, é um problema quase planetário.

Para pensar em prevenção dessa violência, é necessário buscar suas raízes, suas causas diretas e indiretas. Quarenta e seis países europeus adotaram políticas nacionais de prevenção elaboradas a partir de um acordo firmado no Conselho da Europa. A gota d'água foi a tragédia do estádio Heysel, na Bélgica, em 1985, que deixou 39 mortos na final da Copa dos Campeões. Os primeiros participantes do Convênio Europeu sobre a violência e mau comportamento em eventos esportivos, proposto após a tragédia de Heysel, foram Inglaterra, Itália e Espanha, entre outros. Hoje, estes são os países com maior sucesso na promoção de espetáculos de futebol.

O Conselho da Europa, com sede em Estrasburgo (França), hoje cobre praticamente todo o continente europeu, com seus 47 países membros, incluindo os 27 que formam a União Europeia. Fundado em 5 de Maio de 1949 por 10 países, o órgão tem como propósitos a defesa dos direitos humanos, o desenvolvimento democrático e a estabilidade político-social na Europa. O Conselho da Europa tem personalidade jurídica reconhecida pelo direito internacional e serve cerca de 800 milhões de pessoas.

A Espanha e vários países da Europa assinaram em 19 de agosto de 1985, na cidade de Estrasburgo (França), o Convênio do Conselho Europeu, “Convênio Europeu sobre a Violência de Espectadores e de Maus Comportamentos em Eventos Esportivos e em nos Jogos de Futebol”.

Na Espanha, trabalhos acadêmicos e de inteligência policial subsidiaram a elaboração da Lei de Esporte espanhola, de 1990, que dedicou um capítulo especificamente ao tema. Essa legislação tornou ágil o julgamento dos delitos e imputou aos clubes as penas em casos de violência de seus torcedores, assim como aos indivíduos envolvidos em atos de violência e/ou de vandalismo no estádio e em suas imediações. A lei já passou por duas revisões: a primeira versão entrou em vigor em 2007 e a última foi aprovada em março deste ano e entrará em funcionamento a partir de 01 de julho de 2010.

No Senado brasileiro tramita, desde o primeiro semestre de 2009, um projeto de lei, originário do poder Executivo, que modifica e amplia os direitos e deveres dos torcedores e dos organizadores do evento esportivo. Um dos principais acréscimos é a responsabilização criminal e civil tipificada para ocorrências de atos ilícitos em relação com espetáculos esportivos.

Estudos realizados na Europa concluíram que a falta de infra estrutura dos estádios é diretamente responsável pelos atos de vandalismo e de outras formas de violência no interior dos mesmos. Por isso, muitas recomendações do Tratado Europeu dizem respeito à modernização dos estádios. Segundo as autoridades europeias, ambientes confortáveis e seguros inibem a violência.

O Tratado Europeu é um tratado sobre a prevenção da violência em espetáculos esportivos e do mau comportamento de espectadores, com atenção especial ao futebol, assinado pelos países membros do Conselho da Europa a partir de 1985.

No Brasil, as frustrações geradas com o mau funcionamento dos serviços e da infra estrutura dos estádios contribuem para manifestações violentas. O confronto de torcedores no Estádio do Pacaembu em 1995, na final da Copa São Paulo de Juniores, parecia ter sido a gota d'água. Porém, outras tragédias se sucedem ano a ano. O episódio de 1995 chocou a sociedade pela crueldade dos jovens agressores armados com entulhos encontrados no próprio estádio, o que é inadmissível em todos os aspectos.

O futebol não é só futebol. Este esporte é, em muitos países, a expressão de seu povo.

Torcer, ter admiração por um time, reunir-se com amigos e estranhos a beira de um campo... tudo isso é muito sadio e prazeroso! Agora, perder a linha que separa o “eu” e o clube, cometer atos insanos e causar pânico à população são patologias de uma sociedade que ainda busca caminhos para a paz, a tolerância e a harmonia.



*Heloisa Helena Baldy dos Reis é livre docente e coordenadora do Grupo de Pesquisa de Futebol (GEF) da Unicamp e autora dos livros Futebol e violência, pela Editora Autores Associados, e Futebol e sociedade, pela Liber Livros.

Foto: Heitor Shimizu



http://www.univesp.ensinosuperior.sp.gov.br/preunivesp/118/paix-o-e-viol-ncia-no-futebol.html

sábado, 5 de abril de 2014

CONDUTA DISCRIMINATÓRIA


ZERO HORA 05 de abril de 2014 | N° 17754

ARTIGOS

por Luiz Carlos Mabilde*




A cada nova edição de conduta discriminatória (CD) nos estádios de futebol, mais pessoas (chocadas) indagam umas às outras e às autoridades se tais fatos não deixarão de ocorrer. A CD envolve agressão, sofrimento mental e pode adquirir grande magnitude. Apesar disso, repetem-se atos de intolerância, ódio irracional ou aversão a outras pessoas, por razões étnicas, religiosas, culturais, sexuais e tantas outras.

Trata-se de uma atitude preconceituosa, pois é consequente a uma ideia formada sem contestação, fundamento sério ou reflexão que a justifique. Ela começa pela influência da família, cresce nas escolas, clubes e ruas, fortalece-se nas instituições, estádios e partidos; finalmente, estrutura-se nas cidades e países. Algumas constatações agravam ainda mais o problema: todos discriminam, não havendo período da História isento de CD e, o que é pior, ela parece imperturbável.

Freud buscou outros fatores para melhor compreender o padrão cultural preconceituoso e sua inalterabilidade. Encontrou-os na própria personalidade humana. De início, entendeu que o narcisismo imporia um isolamento pessoal ou grupal dos outros por não tolerar diferenças. Depois, percebendo a agressividade intrínseca ao homem, Freud afirmou: “O homem é o lobo do homem”, na medida em que o próximo é alguém que o tenta a satisfazer toda sua agressividade. Bastam os seguintes exemplos: as invasões dos hunos, dos mongóis, dos cruzados e o holocausto perpetrado na última guerra mundial.

O fenômeno apocalíptico – como ideologia profunda da personalidade – completaria a equação causal da CD. O apocalipse é uma visão do mundo e de seu final. Um julgamento. Uma crença de que os inimigos de um povo seriam erradicados pelos anjos bons do céu, restando na terra apenas os justos. Assim, o esquema apocalíptico contém ideias patológicas de destruição selvagem dos outros e de renascimento messiânico de um só grupo, o que inevitavelmente evoca a CD, na proporção cabível para cada evento estudado.

Não parece haver fórmula mágica para erradicar a CD como parte do comportamento humano. Encará-la como produto do preconceito associado a um distúrbio mental seria, além do enquadramento penal, outra forma de inibi-la. Do contrário, seguiremos assistindo a sua prática em estádios e guerras, assim como a sua negação. Todo dia se vê alguém autodenominar-se isento de discriminações ou criticá-las fortemente, porém, ao exortá-las, apontar alguma particularidade discriminativa do outro, ao invés de simplesmente não fazê-lo.

*PSIQUIATRA E PSICANALISTA